segunda-feira, novembro 12, 2007

UM POEMA NO "ABRUPTO"

(Novembro de 2007)

The First Men on Mercury

-We come in peace from the third planet.
Would you take us to your leader?

-Bawr stretter! Bawr. Bawr. Stretterhawl?

-This is a little plastic model
of the solar system, with working parts.
You are here and we are there and we
are now here with you, is this clear?

-Gawl horrop. Bawr Abawrhannahanna!

-Where we come from is blue and white
with brown, you see we call the brown
here ‘land’, the blue is ‘sea’, and the white
is ‘clouds’ over land and sea, we live
on the surface of the brown land,
all round is sea and clouds. We are ‘men’.
Men come –

-Glawp men! Gawrbenner menko. Menhawl?

-Men come in peace from the third planet
which we call ‘earth’. We are earthmen.
Take us earthmen to your leader.

-Thmen? Thmen? Bawr. Bawrhossop.
Yuleeda tan hanna. Harrabost yuleeda.

-I am the yuleeda. You see my hands,
we carry no benner, we come in peace.
The spaceways are all stretterhawn.

-Glawn peacemen all horrabhanna tantko!
Tan come at’mstrossop. Glawp yuleeda!

-Atoms are peacegawl in our harraban.
Menbat worrabost from tan hannahanna.

-You men we know bawrhossoptant. Bawr.
We know yuleeda. Go strawg backspetter quick.

-We cantantabawr, tantingko backspetter now!

-Banghapper now! Yes, third planet back.
Yuleeda will go back blue, white, brown
nowhanna! There is no more talk.

-Gawl han fasthapper?

-No. You must go back to your planet.
Go back in peace, take what you have gained
but quickly.

-Stretterworra gawl, gawl…

-Of course, but nothing is ever the same,
now is it? You’ll remember Mercury.

(Edwin Morgan)

segunda-feira, outubro 15, 2007

Umberto Eco in La Repubblica

(Janeiro de 2004)
Os olhos do Duce

Fiz anos há uma semana e, ao festejar a data com as pessoas que me são mais chegadas, reevoquei o dia do meu nascimento. Ainda que dotado de excelente memória, o momento em si não o recordo, mas pude recons­tituí-lo através das histórias que os meus pais me contaram. Parece que quando o médico me extraiu do ventre da minha mãe, feito tudo o que tem de ser feito nestes casos, apresentou-lhe o admirável fruto das suas dores e exclamou: «Veja que olhos, parece o Duce!» A minha família não era nem fascista nem antifascista — como tantas outras da pequena burguesia italiana, encarava a ditadura como um facto meteorológico —, mas era seguramente emocionante para um pai e uma mãe ouvirem dizer que o recém-nascido tinha os olhos do Duce.
Agora, com o cepticismo próprio da idade, inclino-me mais para a ideia que aquele médico dizia a mesma coisa a todas as mães e a todos os pais — e, olhando-me no espelho, vejo-me mais parecido com um grizzly do que com Mussolini, mas isso pouco importa. Os meus pais estavam felizes por saber que eu me parecia com o Duce.
Pergunto-me o que é que um médico adulador diz hoje a uma mãe que acabou de dar à luz. Que o produto da sua gestação se parece com Berlusconi? Provoca-lhe uma depressão. Presumo que qualquer médico dotado de um mínimo de sensibilidade vá buscar outros exemplos — os olhos e a expressão de um apresentador de televisão, o sorriso de um actor, etc. Cada época tem os seus mitos. A época em que nasci tinha como mito o Homem de Estado, a dos que nascem hoje tem como mito o Homem da Televisão.
A última afirmação de Berlusconi («ninguém lê jornais, mas toda a gente vê televisão») foi interpretada com a habitual cegueira da cultura de esquerda e classificada como mais uma das suas insultuosas gafes, Só que não era nenhuma gafe: era um acto de arrogância, mas não era nenhum disparate. Somando todas as tiragens dos jornais italianos, obte­mos um total bastante irrisório em relação ao número de pessoas que só vêem televisão. Sabendo nós que só uma parte da imprensa italiana critica ainda o actual governo, e que toda a televisão, RAI e Mediaset, se con­verteu na voz do poder, Berlusconi nunca esteve tão dentro da razão. Nos dias que correm, os jornais podem dizer o que bem lhes apetecer, porque a chave do poder reside no controlo da televisão.
Este é um dado de facto, e os dados de facto são por natureza inde­pendentes das nossas preferências.
Parti destas premissas para sugerir que as ditaduras do nosso tempo, a existirem, têm de ser ditaduras mediáticas e não políticas. Há quase cinquenta anos, escreveu-se pela primeira vez que, salvo os casos de alguns países remotos do Terceiro Mundo, já não eram precisos tanques para se fazer cair um governo: bastava ocupar as estações de rádio (a últi­ma pessoa a ignorar este facto foi Bush, líder terceiromundista que por engano chegou ao governo de um país altamente desenvolvido). Agora, o teorema foi demonstrado.
É errado dizermos que não se pode falar de «regime» berlusconiano, porque a palavra «regime» evoca o regime fascista, e o regime em que vivemos não tem as características do daquele vinténio. Um regime é uma forma de governo, não necessariamente fascista. O fascismo abolia a liberdade de imprensa, ao passo que o regime mediático de Berlusconi não é tão tosco e antiquado. Sabe que o consenso é assegurado pelo con­trolo dos meios de informação mais invasivos. Quanto ao resto, não custa nada permitir que haja muitos jornais que critiquem o governo (permissão que só é válida até ao dia em que for possível comprar esses jornais — refiro-me à propriedade, não a uma cópia). Para que é que serve desterrar Biagi(XX"), correndo o risco de convertê-lo num herói? Basta impedi-lo de voltar a falar na televisão, esperando que caia no esqueci­mento.
A diferença entre um regime mediático e um regime como o fascista é que no segundo toda a gente sabia que os jornais e a rádio só transmi­tiam informações vindas do governo, e que não se podia ouvir a Rádio Londres, sob pena de prisão. Precisamente por isto, no tempo do fascis­mo, as pessoas desconfiavam dos jornais e da rádio, ouviam a Rádio Londres com o volume no mínimo, e só confiavam nas notícias que lhes chegavam através do burburinho, do boca a boca, da maledicência. Num regime mediático em que, digamos, dez por cento da população tem acesso à imprensa de oposição enquanto o resto recebe as notícias atra­vés de uma televisão controlada, vigora, por um lado, a convicção de que é permitido discordar («há jornais que dizem mal do governo, e a prova é que Berlusconi se queixa sempre deles, logo há liberdade») e, por outro lado, o efeito de realidade causado pelo impacte da notícia televisiva leva a que só se saiba e só se acredite naquilo que diz a televisão («se sei que é verdade que um avião caiu ao mar, mais verdadeiro é se vir as sandá­lias dos mortos a boiar, e não interessa se por acaso são sandálias de um desastre anterior, tiradas das imagens de arquivo»).
Uma televisão controlada pelo poder não tem necessariamente de censurar as notícias. Claro, há sempre tentativas de censura por parte dos escravos do poder, e em Itália tivemos recentemente o caso Biagi que, felizmente, aconteceu ex post (para usar a expressão característica daque­las pessoas que também dizem «é só um momentinho» e «pool» position). Foi considerado inadmissível que alguém dissesse mal do chefe do go­verno de forma tão aberta (esquecendo-se de que num regime democrático se pode e se deve dizer mal do chefe do governo, caso contrário a demo­cracia converte-se num regime ditatorial). Mas estes são apenas os casos mais visíveis (e, se não fossem trágicos, risíveis). O problema é que se pode instaurar um regime mediático pela positiva, dando a impressão de que se diz tudo. Basta saber como dizê-lo.
Se nenhuma televisão transmitisse as opiniões de Fassino(xx"') sobre esta ou aquela lei, os telespectadores começariam a suspeitar que a tele­visão estava a ocultar algo, porque sabem que existe uma oposição.
O que a televisão de um regime mediático faz é recorrer ao artifício retó­rico da «concessão». Vejamos um exemplo. Há pelo menos cinquenta prós e cinquenta contras acerca da conveniência de se ter um cão. Os prós são que o cão é o melhor amigo do homem, que pode ladrar se aparece­rem ladrões, que as crianças iam adorá-lo, etc. Os contra são que é pre­ciso levá-lo todos os dias a fazer as suas necessidades, que se gasta dinheiro na comida e no veterinário, que é difícil levá-lo de viagem... Admitindo que queiramos defender os cães, o artifício da concessão fun­ciona da seguinte maneira: «É verdade que os cães custam dinheiro, que representam uma escravidão, que não se podem levar de viagem» (e os adversários dos cães sentem-se conquistados pelo nossa honestidade), «mas é preciso pensar que são uma óptima companhia, que as crianças os adoram, que nos protegem dos ladrões, etc.» Esta seria uma argu­mentação persuasiva a favor dos cães. Contra os cães, poderíamos con­ceder que são uma óptima companhia, que as crianças os adoram, que nos protegem dos ladrões, mas teríamos de seguir a argumentação oposta, ou seja, que os cães representam uma escravidão, uma despesa, um obs­táculo às viagens. Teríamos assim uma argumentação persuasiva contra os cães.
A televisão funciona desta maneira. Quando se discute uma lei, a televisão enuncia-a e dá de imediato a palavra à oposição, com todos os seus argumentos. Depois volta a transmitir o ponto de vista dos defen­sores do governo, que objectam contra as objecções da oposição. O resul­tado persuasivo é invariavelmente o mesmo: o último a falar tem sempre razão. Sigam com atenção os telejornais, e verão que a estratégia é esta: a seguir à apresentação do projecto, nunca aparecem em primeiro lugar os apoiantes do governo e, em segundo, as objecções da oposição. É sempre ao contrário.
Um regime mediático não tem necessidade de mandar prender os opositores. Não os reduz ao silêncio através, mas fazendo ouvir as suas razões em primeiro lugar.
Como é que podemos reagir a um regime mediático, dado que para reagir seria necessário termos acesso aos media, que são controlados pelo próprio regime?
Enquanto a oposição italiana não encontrar uma solução para este problema e continuar a deleitar-se nos seus choques internos, Berlusconi vencerá.

(xx") Enzo Biagi, conhecido jornalista, apresentou durante sete anos na RAI 1 o programa diário «Il Fatto», em que analisava os acontecimentos mais importantes da actualidade política e social. Em 2002, na sequência de uma polémica intervenção de Roberto Benigni no programa, o governo de Silvio Berlusconi considerou ter havido um «uso criminoso da televisão pública» e «Il Fatto» acabou por ser suspenso. Posteriormente, Biagi foi convidado a retomar as emissões na RAI 3, mas declinou por «motivos pes­soais». (N. da T.)

(xx" 'a Piero Fassino, secretário-geral dos Democratas de Esquerda. (N. da T.)